https://portalleodias.com/ Karol Gomes
No espetáculo, gravado em Curitiba e publicado na internet, Leo Lins utilizava o humor para fazer comentários preconceituosos sobre diferentes grupos, como negros, nordestinos, pessoas com deficiência, idosos, judeus e homossexuais
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou um parecer favorável à revisão da pena aplicada ao humorista Leo Lins, condenado a 8 anos e 3 meses de prisão por discriminação em piadas feitas em seu especial de comédia Perturbador, divulgado no YouTube. Além da pena de prisão, a Justiça havia fixado multa superior a R$ 1,4 milhão, valor que o órgão pede para reduzir para aproximadamente R$ 53 mil.
A condenação do humorista foi estabelecida em 2023, após denúncia feita pelo próprio MPF. No espetáculo, gravado em Curitiba e publicado na internet, ele utilizava o humor para fazer comentários preconceituosos sobre diferentes grupos, como negros, nordestinos, pessoas com deficiência, idosos, judeus e homossexuais. A gravação ultrapassou 3 milhões de visualizações antes de ser retirada do ar por decisão judicial.
Divergência sobre a forma de calcular a pena
Em manifestação apresentada no início de setembro, o procurador regional da República Vinícius Fermino defendeu a manutenção da condenação, mas pediu ajustes na forma como a pena foi calculada. Para a Justiça Federal de 1ª instância, cada piada contra diferentes grupos representava um crime distinto, caracterizando continuidade delitiva.
O MPF, por outro lado, entende que houve apenas um ato — a publicação do vídeo — que atingiu simultaneamente diversas minorias, o que configuraria concurso formal, e não crimes separados. Essa interpretação reduz o tempo de prisão previsto e impacta também no cálculo das indenizações.
Com essa reclassificação, o órgão defende que os crimes sejam reconhecidos em menor quantidade: seis vezes pela Lei 7.716/1989 (que trata de preconceito de raça, cor, etnia e religião) e uma vez pelo crime de discriminação contra pessoas com deficiência.
Multa e indenizações
A sentença havia fixado multa equivalente a 1.170 salários mínimos de 2022 — pouco mais de R$ 1,4 milhão. No entanto, o parecer do MPF sugere adequar esse valor à realidade financeira do humorista, que declarou renda mensal entre R$ 10 mil e R$ 100 mil. A nova proposta reduz a multa para cerca de 44 salários mínimos, pouco acima de R$ 53 mil, além de rever os valores de indenização por danos morais coletivos.
Em nota, a Procuradoria Regional da República da 3ª Região destacou que o documento “aborda tema jurídico de alta indagação e complexidade”. O parecer afirma ainda que “concluiu o parecer recursal pela necessidade de manutenção da condenação criminal obtida em primeiro grau de jurisdição, embora em relação a um número menor de coletividades vulneradas do que aquelas indicadas na sentença, com redução das penas em razão disso, bem como por força de outros aspectos técnicos da dosimetria”.
O pedido do MPF ainda será analisado pelo Tribunal Regional Federal, que decidirá se acata ou não os argumentos apresentados.
Ao fixar a pena em 1ª instância, a juíza Barbara de Lima Iseppi considerou como agravantes o alcance do vídeo na internet e a diversidade de grupos atingidos. Ela destacou que a atividade humorística não pode servir de justificativa para a prática de crimes.
Segundo a decisão, “o exercício da liberdade de expressão não é absoluto nem ilimitado, devendo se dar em um campo de tolerância e expondo-se às restrições que emergem da própria lei”. O texto acrescenta ainda: “No caso de confronto entre o preceito fundamental de liberdade de expressão e os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica, devem prevalecer os últimos.”
Histórico de polêmicas
Leo Lins já havia se envolvido em outras situações semelhantes. Em 2022, foi condenado a pagar R$ 44 mil por ofender a mãe de um jovem autista em uma rede social. No mesmo ano, também gerou revolta ao ironizar uma criança com hidrocefalia.
No ano anterior, em 2021, teve uma apresentação cancelada pela Prefeitura de Guarujá (SP). O município alegou problemas técnicos no teatro, mas o humorista acusou a administração de censura.